Navegar é preciso


Chegamos ao fim. E novamente ao começo. Tempos corridos, agitados, confusos. Mais um ano se vai e me deixa somente com as lembranças. Me orgulho de analisar o que passou, cada detalhe bobo, que somente eu lembro. Cada risada gostosa compartilhada com os amigos, cada lágrima solitária no meu travesseiro. As saudades, os reencontros. Os conflitos e os abraços. As novas experiências, as novas pessoas, os novos lugares. Cada um que marca um pouco desses longos (ou nem tanto) 365 dias. E agradeço. Agradeço aos céus, ao acaso, ao destino. Por cada pessoa, em sua singular essência. Pelo aprendizado, pelos tropeços, pelas conquistas. Estes não terminam juntamente com o ano.
Borboletas no estômago, ansiedade, medo, curiosidade. É o que se sente ao pensar no início de um novo ciclo. Levo na bagagem a experiência deste ano, e de todos os outros passados. Ainda há muito o que aprender. Encontrarei dificuldades, obstáculos. Estou indo em direção ao desconhecido, são outros tempos. Serão outros lugares, virão outras pessoas.
Vamos brincar de viver, que seja bem-vindo o novo ano.

X e Y de uma mesma equação


Eu prefiro meu café com bastante açúcar e leite, o seu é puro e mais amargo. Eu gosto dos Beatles e você prefere mais guitarra e mais bateria. Sua cor favorita é preto e eu amo branco. Eu detesto física e você não gosta de química. Harmonia em meio à divergência. Talvez não houvesse tanta graça sem tanta diferença. Talvez todos os outros sejam muito comuns. Talvez a maneira como você discorda veementemente de mim me intrigue. Nós combinamos, de um jeito só nosso, nós combinamos. Há uma combinação, um encaixe, uma ligação. Nos olhares e nos gestos, nas menos pensadas palavras, ou nas mais elaboradas. No abraço e na saudade. No paradoxo e na ironia. Estamos ligados, de alguma forma, forma a qual chama-se vulgarmente de amor.


"Love is always patient and kind. It is never jealous. Love is never boastful or conceited. It is never rude or selfish. I does not take offense and is not resentful."

Uma noite longa pra uma vida curta


Um quarto abafado com cheiro de xícara de café vazia, um lençol amarrotado, uma música tocando baixo. Um dia comum em todo o seu tédio e neutralidade. Fragilidade incidente, de dentro pra fora, lágrimas involuntárias. Consegue ver? Me diga que sim. Tente visualizar também o céu noturno que eu vejo por de trás dos vidros da janela. Uns aviõezinhos bem longe piscando, azul, vermelho, azul, vermelho. E o meu cabelo bagunçado, do jeito que você gosta, espalhado pelo travesseiro onde você esteve deitado, bem pertinho de mim. Consegue ver? Faça um esforço um pouco maior e enxergue dentro de mim. Consegue ver? Espero que sim.

Mundos à parte


Você sabe do que um ser humano é capaz? Ele é capaz de mentir, de desrespeitar, humilhar, machucar. Ele é capaz de roubar, matar. Ele é capaz de destruir o próprio planeta. Ele é capaz de criar barreiras entre seus iguais. Ele é capaz de matar inocentes, de inocentar criminosos. Você realmente sabe do que um ser humano é capaz?

O ser humano é capaz de parar um tanque de guerra, de derrubar um regime, de criar uma rebelião, uma religião. O ser humano é capaz de lançar uma ideologia, de descobrir uma cura, de resolver uma equação algébrica. Ele é capaz de perdoar. Você realmente sabe do que um ser humano é capaz?

O ser humano é dotado de enorme capacidade, físico e mental. Tão grande que este mesmo a desconhece. O ser humano não foi feito para ser bom. O ser humano não foi feito para ser mau. O ser humano foi feito de maneira detalhista e complexa, e dotado de enorme força, energia, capacidade, vontade, inteligência. Foi dado a ele o livre arbítrio, para que este utilize sua inteligência e sensatez para decidir por si só as melhores decisões a serem tomadas. Ele responde por suas escolhas, ele sofre as consequências.

Você sabe do que um ser humano é capaz? Mais do que física, mais do que química, o ser humano pensa, sente. Um ser humano é capaz de amar.


Why do you like to hurt so much?

Brinquedos tortos


Uma garotinha brinca na praça em um ensolarado e agradável dia de primavera, não há ninguém ao seu lado mas ela tagarela e descorre sobre uma infinidade de fatos com o vento. De mão dadas com um ursinho com seu eterno sorriso, ela vai caminhando e conversando, parando para pegar flores, folhinhas, analisar insetos. Já não é mais o meu tempo de ter amigos imaginários, de conversar com os meus brinquedos. Um vazio imenso toma conta de mim, a carência já não é mais facilmente preenchida com uma boneca, imaginar um planeta só meu com unicórinios e fadinhas já não funciona, pelo menos, não pelo tempo desejável. Seja por uma questão biológica e/ou emocional, me sinto solitária. Eu invejo aquela garotinha baixinha e ruiva, ela parece tão feliz, nem se aproxima das outras crianças que correm em volta das árvores, ela está satisfeita. Eu acabo preenchendo o meu vazio enchendo os outros. Durante os anos que se passaram, meus ursinhos ficaram surdos.

When The Wind Blows


I'll leave when the wind blows
Take a breath and away it goes
I'll be outside of your window
I'll pass by but I'll go slow
I'll leave when the wind blows

Crime


Teus olhos atravessam a despreocupada multidão em busca dos meus, eu sinto isso. Não sei se isso deveria acontecer, mas eles encontram o alvo. Tiros certeiros de centenas de milhares de verbos, advérbios, muitas conjunções, reticências e interrogações conseguem me acertar a uma distância enorme. Como se estivéssemos cometendo um crime, e como se todos aqueles inocentes ao nosso redor pudessem testemunhar, ambos desviamos nossos olhares.

E se eu fosse, eu teria ido. Mas também, que diferença que faz?

Pensamento Avulso

Dizem que no amor e na guerra vale tudo. São duas coisas onde pessoas saem feridas. Muito feridas. E não me agrada correr o risco de ferir alguém. Sem estratégias, armas ou combates, que venha o general Tempo e resolva isso.

Puro, simples, forte.

Sorrir é a melhor coisa do mundo. Ai de quem duvide de mim. Como é muito do meu feitio, eis que vou argumentar para te provar que isso é verdade. Primeiramente, faz bem pra musculatura da face, você move alguns muitos músculos para sorrir. O sorriso é uma ótima primeira-impressão, as pessoas ficam mais bonitas ao sorriem! Sorrir demonstra felicidade, é provado cientificamente que a felicidade é uma forma de atrairmos seres da nossa espécie! O sorriso é puro, sincero, afinal, quem não sabe reconhecer um sorriso amarelo, sem graça? Sorrir faz com que as pessoas ao teu lado se sintam motivadas a sorrir (que nem bocejos, apesar de estes não serem bons), um sorriso pode significar tantas coisas! "Vá em frente!" "Quanto tempo!" "Obrigado" "Passei no vestibular" "Sem problemas" "Eu te amo", são só uns poucos exemplos. Se o sorriso não fosse bom, por que sorrimos quando as coisas vão bem? Nem sempre o ato de sorrir é fácil e natural. Como sorrir com tanta miséria, egoísmo, tristeza, gás carbônico, álgebra linear, prisão de ventre e desamor no mundo? E com tantos problemas, ao iluminar o teu semblante com um sorriso, tu provas ser um ser humano capaz de lutar contra isso, de ver que há uma solução, há um lado positivo e que o pior há de passar. Por que ainda choras, pequena?

A Menina Que Roubava Caixinhas De Leite



Eu, o sofá, uma almofada e a caixa de leite.

É curioso que depois de tantos anos eu não tenha esquecido algo tão bobo.
Eu deveria ter por volta de três ou quatro anos de idade, um projeto de ser humano. Naquele dia não havia muita gente em casa, alguém cozinhava. Fui até a cozinha, o apartamento era minúsculo, a cozinha era um corredor, não cabia muita gente lá, eu geralmente não era bem vinda na cozinha, mas quem quer que estivesse cozinhando, não se importou com a minha presença. Abri a geladeira e lá estava: uma bela caixinha de leite, aquelas longa vida, com leites processados à uma ultra alta temperatura; eu sei disso agora, naquele dia qualquer da década de 90, ela resumia-se somente à uma caixinha de leite comum, com a pontinha cortada; Então, olhei novamente para quem cozinhava, e ela parecia estar indiferente ao fato de eu estar na cozinha fazendo o que quer que seja, e então arrisquei a pegar a caixinha de leite. Eu não liguei se ela iria me mandar devolver, eu peguei. Deitei numa almofada sobre o sofá, cruzei minhas até então pequenas pernas e bebi o leite, sem copo mesmo, direto na caixinha. Ai de quem reclamasse. O leite de caixinha nunca estivera tão gostoso como naquele dia. O mundo girava em torno daquela estranha cena, o tempo sequer ousou passar, ninguém incomodou. Levantei-me languidamente, coloquei a caixa vazia em cima da pia, e saí com um estranho ar de triunfo da cozinha. O mundo nunca mais parou para que eu bebesse uma caixinha de leite só minha, aliás, ele nunca mais parou para que eu fizesse coisa alguma.

Where do they all come from?


O Lennon se perguntava "all the lonely people, where do they all come from?" e até hoje essa pergunta não foi respondida. Acho divertido cantarolar esse trecho de Eleanor Rigby, porque sei que eu sou uma eleanor rigby da vida, e penso o mesmo de você. Gosto também de pensar, que não chegamos ao trágico fim que o Lennon retrata nos versos tristes dessa música. Porque por alguma graça, coincidência ou consequência, ou qualquer outra ordem (ou a falta dela) que a natureza obedeça, tivemos a chance de nos encontrar. Talvez ainda sejamos tais qual a Eleanor Rigby, existem muitos e muitas tais qual ela pelo mundo. O bom é conhecer essas pessoas, e pensar de que elas vieram do nada, mas que a partir do momento que você a conhece e passa a amá-las, elas deixam de ser fulano vindo de lugar algum que vai para algum lugar, e passam a ser fulano que veio de lugar algum e que agora têm um lugar, caso ele não tenha pra onde ir, do lado esquerdo do nosso peito. E você sabe, você sente que mesmo sem poder oferecer nada de muito especial, você moverá montanhas e fará o impossível pra garantir o conforto desse estranho. Seja bem-vinda, garotinha complicada vinda de lugar algum, segure a minha mão, vamos em busca de um lugar que seja nosso. Caso a gente não ache, quem se importa? Temos uma à outra.

a vida é mesmo coisa muito frágil, uma bobagem, uma irrelevância, diante da eternidade do amor de quem se ama.

Um dia qualquer (21 de março)

Domindo embalado pelas baladas românticas do Cazuza; o amável som da chuva, interrompido diversas vezes por raios imponentes e por muitos lenços de papel (resfriado). É a primeira chuva de verdade de março, não que exista alguma de mentira, mas para a época, era de se esperar mais. É outono, o equinócio teve início ontem. A essa hora eu deveria estar dormindo, mas estou jogando caligrafia fora. Visto um confortável pijama cinza, cinza tal qual o céu cheio de novens carregadas da manhã tempestuosa, e cinza tal qual o meu humor. Não associe cinza a algo triste, eu vejo o cinza como uma cor neutra. Não é branco, que ao meu ver seria a paz de espírito, uma alegre nuvem de um céu de verão, uma bolinha macia de algodão. Também não é preto, o vazio, o incerto, escuro, tal qual o breu janela afora. Cinza é o meio termo, é a mistura entre os extremos, é somente cinza. Tenho pensamentos brancos, felizes; tenho pensamentos negros, tristes. Opto então por não pensar em nada, opto por manter-me neutra, ou então, adentraria a madrugada a remoer e a imaginar infinitas situações, a vagar por tortuosos caminhos pelos quais minha confusa mente me carrega e isso requer paciência, e tempo, e amanhã eu acordo cedo, para mais um dia rotineiro, comum, neutro, mais um dia cinza no ano.
S.M.S, Beija-Flor.

Tal qual a luz da lua


As ruas, as calçadas, as árvores, as pedras, as poças, a lua rechonchuda tinge de prata, lá do alto, aquele momento. Ela pinta nossos rostos, a brisa que brinca com nossos cabelos, os nossos pés descalços que nos levam sem nossa concessão para lugar nenhum. Ela pinta os nossos sorrisos, o calor do nosso hálito que é visível graças à noite fria, até as mais banais palavras ditas. E não importa para onde a gente ande, corra, se esconda, ela nos segue, banhando nosso pequeno pedaço de mundo em monocor. Eu, você e tudo que nos envolve. A felicidade é prata, tal qual a luz da lua.

Em cima do telhado o ar é tão frio e tão calmo, eu digo o seu nome em silêncio, mas você não quer ouvi-lo agora. Os olhos da cidade estão contando as lágrimas que caem, cada lágrima é uma promessa de tudo que você nunca saberá.

Eu sou um aeroporto.

Na verdade, todos nós. Que outro lugar, senão um aeroporto, condensa sob o mesmo teto a alegria do encontro e a tristeza da despedida? Vejo pedaços de mim acima das nuvens, em logradouros distantes, em cidades inóspitas. Recebo, também, de todo lugar, pedaços do mundo que, como ímãs, aplicam-se sobre a minha pele e lá ficam para a posteridade, exibidos por onde passo.

Alguns têm a pista embrenhada entre matas, encoberta por nuvens de chuva, radares desligados ou intencionalmente sabotados. Tem gente que tem medo de avião.

Por medo das partidas, tem gente que não deixa ninguém chegar. São aeroportos fechados. No entanto, a gente só percebe o calor do abraço quando sente a dor de respirar o ar frio da solidão. Você brada aos céus toda sorte de impropérios, mas não percebe que vôo nenhum te encontra no radar.

Eu sou um aeroporto. Chegadas e partidas são a única certeza na minha vida. Meus olhos estão virados pro futuro, focados na estrada que se prostra à minha frente. Encontro em mim, com igual facilidade, motivos para persistência ou para desistência. E continuar pra quê? Continuo com a força do que levo pra vida. O saldo positivo disso tudo é a quantidade de aviões que acolho em meus hangares. Pedaços de histórias que conto pra mim mesmo todo dia, enquanto ergo um tímido sorriso quase que instantâneo de realização.

E você, aeroporto em greve, tá esperando o quê, olhando pra cima?

(Avião não pousa em aeroporto fechado)


Lucas Silveira.

Certa vez, me pediram para escrever algo sobre o amor, um dos desafios mais difíceis que já me fizeram. O amor não é algo fácil de se definir, ama-se justamente pelo que ele tem de tão indefinível. Sentimento que não obedece a razão, que ultrapassa limites, que move montanhas. Tamanha energia que você pode gerar dentro de si próprio, tão grande que não há medida que calcule suas dimensões. Tão simples, tão puro e tão complexo. Ama-se, somente isso. Me perguntaram também se eu já havia amado, eu disse que sim, e que o felizardo tinha apenas 3 anos. E ele não precisa fazer mais que estampar um gostoso sorriso no rosto para me deixar feliz. Isso é amor.